Menores de 14 anos não precisam mais de autorização dos pais
A “Resolução nº 258” do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) foi divulgada na quarta-feira, 8, no Diário Oficial da União. As novas diretrizes para o tratamento de crianças e adolescentes que sofreram violência sexual são estabelecidas no texto, que também regula o acesso ao aborto para este grupo.
O texto salienta que a terminação da gravidez nos casos legalmente permitidos – estupro, risco à vida da mulher grávida e anencefalia – deve ser garantida de forma rápida, sem a criação de obstáculos burocráticos. Conforme a resolução, o “desejo ou a vontade da criança ou adolescente” deve ser respeitado .
Uma das alterações mais significativas é a remoção da obrigatoriedade de fazer um boletim de ocorrência para a execução do aborto, bem como a isenção de uma sentença judicial ou notificação ao Conselho Tutelar.
Também é estabelecido pela resolução que os trabalhadores da saúde precisam esclarecer à vítima todas as opções antes do procedimento, para que “a criança ou a adolescente compreenda todas as implicações de cada opção antes de tomar uma decisão”.
Além disso, a resolução reforça que a ausência dos pais ou responsáveis não pode impedir a realização do procedimento. “A criança e o adolescente possuem direito à autonomia, à privacidade e à confidencialidade no atendimento”, afirma o documento.
A resolução também caracteriza como conduta discriminatória a recusa em realizar a interrupção da gestação baseada “meramente na descrença” sobre o relato da vítima de violência sexual.
A regulamentação estipula que os centros de saúde precisam assegurar a disponibilidade de profissionais para a execução do procedimento e que deve ser evitado “a presença de profissionais objetores de consciência em equipes destinadas à prestação do serviço de interrupção legal da gestação”.
O direito do profissional de saúde de se negar a efetuar certos procedimentos, como o “aborto” ou a “eutanásia”, baseado em suas convicções pessoais ou religiosas, mesmo que tais práticas sejam legalmente permitidas, é conhecido como objeção de consciência.
Em última análise, o texto salienta que ações destinadas a constranger, humilhar ou intimidar a criança ou adolescente que procura interromper a gravidez serão classificadas como violência institucional e podem resultar na responsabilização dos participantes.
Decisão sobre aborto foi autorizada pela Justiça
A Justiça Federal autorizou na terça-feira, 7, a publicação da resolução. O desembargador Ney Bello, do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), proferiu a decisão em resposta a uma ação judicial que questionava a Resolução nº 02/2024, do Conselho Federal de Medicina.
No documento, o desembargador defende a ideia de que a medida garante os direitos das adolescentes e respeita a legislação brasileira, que permite a interrupção da gravidez em casos de estupro. “A exigência da autorização parental pode, muitas vezes, inibir ou até impedir que a vítima busque auxílio médico, expondo-a a riscos maiores”, disse Bello na decisão.
A norma determina que a menor precisa expressar claramente seu desejo para a execução do procedimento. A jovem deve ser acompanhada por um time multidisciplinar formado por médicos, psicólogos e assistentes sociais, que irão avaliar sua capacidade de discernimento.
O desembargador também afirmou que a medida está em conformidade com o Estatuto da Criança e do Adolescente e com a Constituição Federal. “A proteção integral da criança e do adolescente não pode ser comprometida por barreiras burocráticas que desconsiderem o contexto de extrema vulnerabilidade em que se encontram”, afirmou Bello.
A ex-ministra de Direitos Humanos e atual senadora Damares Alves (Republicanos-DF), que é a responsável pela ação judicial que inicialmente impediu a medida, expressou sua crítica à decisão e informou que irá apelar. “Isso é um retrocesso”, afirmou ela em protesto. “Vou persistir nessa batalha, vou apelar. Essa resolução é uma forma de acobertar pedófilos.”
O debate sobre a proposta se estendeu por meses e encontrou oposição dentro do governo de Luiz Inácio Lula da Silva, devido ao possível desgaste político. A resolução recebeu 15 votos positivos de representantes de ONGs e movimentos sociais, enquanto os 13 votos negativos foram dados por conselheiros nomeados pelo governo federal.As informações são da Revista Oeste.