Veto à medida teve grande repercussão e foi justificado pelo governo pela falta de uma fonte de custeio
O projeto de lei (PL) 4968/2019, de autoria da deputada Marilia Arraes (PT-PE), teve grande repercussão nos noticiários ao longo desta quinta-feira (7) após ter alguns trechos vetados pelo presidente Jair Bolsonaro, especificamente dos artigos que diziam respeito à distribuição de absorventes femininos para determinada parcela da população.
No despacho publicado no Diário Oficial da União (DOU), Bolsonaro justificou a aplicação dos vetos dizendo, entre outros pontos, que o texto aprovado pelo Congresso não indicava “a fonte de custeio ou medida compensatória”, o que “contraria o interesse público”.
De acordo com o Congresso, a medida representaria um impacto orçamentário de R$ 84,5 milhões por ano aos cofres públicos. O cálculo inclui 8 absorventes por mês para cada uma das 5,6 milhões de mulheres que a medida alcançaria, em uma média de R$ 0,15 por absorvente, ou R$ 1,20 por mês para cada mulher.
Para custear os valores, o projeto estabeleceu que as receitas seriam provenientes dos recursos vinculados ao programa de Atenção Primária à Saúde do SUS (Sistema Único de Saúde) e do Funpen (Fundo Penitenciário Nacional), no caso das mulheres detidas.
Confira abaixo quais foram os pontos utilizados pelo governo para justificar os vetos:
1. Lei não indica fonte de custeio ou medida compensatória para a distribuição dos absorventes
Item mais divulgado e até ressaltado pelo presidente Jair Bolsonaro a respeito do veto, a falta de uma fonte de custeio ou de uma medida compensatória para honrar com a distribuição dos absorventes diz respeito a uma obrigação prevista em uma série de pontos de leis existentes no país, entre elas as conhecidas leis de Responsabilidade Fiscal e de Diretrizes Orçamentárias.
Na prática, essas leis estabelecem que para que um gasto seja criado, expandido ou aperfeiçoado pelo poder público, é preciso que seja feita a “estimativa do impacto orçamentário-financeiro no exercício em que deva entrar em vigor e nos dois subsequentes” e a “declaração do ordenador da despesa de que o aumento tem adequação orçamentária e financeira”.
Ou seja, para que o governo possa gerar um novo gasto, ele precisa dizer, na prática, de onde será retirada a verba para cobrir a referida despesa. Do contrário, o governo violaria a Lei Complementar n° 101, de 4 de maio de 2000, conhecida como Lei de Responsabilidade Fiscal.
Ao longo do PL 4968/2019, o Congresso até elencou algumas fontes para custear a distribuição, como o Fundo Penitenciário Nacional – Funpen, no caso das detentas, e os recursos do SUS, nas demais situações, mas como o governo destacou que os dois valores não poderiam ser legalmente aplicados na distribuição do item, não sobraria uma fonte de custeio válida.
2. Não há compatibilidade com a autonomia das redes e estabelecimentos de ensino
A medida de acordo com o texto do veto, feriria o princípio da autonomia das redes e estabelecimentos de ensino. A autonomia pedagógica, administrativa e de gestão das unidades escolares consta no artigo 15 de um dos regramentos mais importantes da educação, a Lei de Diretrizes e Bases, conhecida como LDB.
O artigo em questão ressalta que “os sistemas de ensino assegurarão às unidades escolares públicas de educação básica que os integram progressivos graus de autonomia pedagógica e administrativa e de gestão financeira, observadas as normas gerais de direito financeiro público”.
3. Os recursos financeiros para o atendimento do benefício para detentas não podem ser disponibilizados pelo Fundo Penitenciário Nacional
De acordo com o governo, “a proposta contraria o interesse público” ao determinar que o custeio da distribuição de absorventes para uma categoria específica de beneficiárias, “caberia a fundo público, pois o art. 3° da Lei Complementar n° 79, de 7 de janeiro de 1994, não elenca o objeto do programa no rol de aplicação de recursos do Fundo Penitenciário Nacional – Funpen”.
Na prática, isso significa dizer que o governo afirmou que não poderia incluir o custeio dos absorventes no Fundo Penitenciário Nacional, o Funpen, por conta da medida não constar nas regras que gerenciam o fundo, previstas na Lei Complementar n°79/1994.
4. Distribuição de absorventes higiênicos femininos não pode ser classificada no rol de Ações e Serviços Públicos de Saúde (ASPS)
Outra justificativa usada pelo governo no veto é de que a oferta gratuita dos absorventes não poderia ser classificada no rol das Ações e Serviços Públicos de Saúde – ASPS, para fins do atendimento ao mínimo constitucional em saúde, por conta do fato de que a norma restringe o público beneficiário e não atende às condições de acesso universal e igualitário previstos na lei que rege as ASPS.
5. A lei não atende aos usuários do SUS de forma ampla, fato que fere o regramento de recursos da saúde
Segundo o governo, a medida aprovada pelo Congresso não atende integralmente os usuários dos Sistema Único de Saúde e nem relaciona a sua distribuição às ações ou serviços de saúde, mas, pelo contrário, restringe as beneficiárias. Assim, a regra descumpriria a Lei Complementar nº 141, de 13 de janeiro de 2012, que determina que os recursos sejam destinados às ações e serviços públicos de saúde de acesso universal, igualitário e gratuito.
6. Medida extrapola as definições do Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional – Sisan
Por fim, o veto define que a distribuição do item extrapolaria o âmbito de aplicação da Lei nº 11.346, de 2006, que dispõe sobre as definições, princípios, diretrizes, objetivos e composição do Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional com vistas a assegurar o direito humano à alimentação adequada. Nesse sentido, segundo o governo, o projeto de lei introduziria uma questão de saúde pública em uma lei que dispõe sobre segurança alimentar e nutricional.